Especialistas contestam MP que cria limite para compensação de crédito

Sovos
janeiro 10, 2024

Medida pode ser questionada na Justiça, inclusive em razão de a restrição trazida possuir características de empréstimo compulsório.

São Paulo – Advogados da área tributária avaliam que a medida provisória (MP) que limita a compensação de créditos tributários gerados por decisões judiciais não pode retroagir para prejudicar contribuintes que possuem valores a receber do governo.

Há discussões, no entanto, sobre quais empresas estariam protegidas da mudança na legislação anunciada no fim de 2023 para aumentar a arrecadação: somente quem entrou com pedido de compensação até o ano passado, todas as que obtiveram o direito ao ressarcimento na Justiça ou também aquelas que possuem ações que ainda não transitaram em julgado. Alguns advogados definem a medida como confisco, empréstimo compulsório ou calote.

O alvo do governo são as grandes empresas que se beneficiaram da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de 2021 na chamada tese do século, que trata da exclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) da base de cálculo do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins).

Nesse caso, empresas que pagaram tributos a mais no passado ganharam o direito de descontar esses valores daquilo que é devido ao governo federal ou receber a restituição por precatório.O Ministério da Fazenda propôs parcelar o uso desse abatimento quando o valor superar R$ 10 milhões.

A norma, publicada no final de 2023, está em vigor de forma provisória e precisa do aval do Congresso para se tornar definitiva.

Na última sexta-feira (5), o Ministério da Fazenda publicou portaria que estabelece os limites mensais para compensação de créditos tributários acima desse valor em um período de 12 a 60 meses, a depender do montante envolvido.

Durante o anúncio das medidas em dezembro, o secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, afirmou que as decisões judiciais que ficaram acima desse patamar representaram R$ 35 bilhões em créditos tributários no ano passado. Ele disse que a restrição poderá representar uma arrecadação de cerca de R$ 20 bilhões a mais em 2024.

Flávio Paranhos, sócio do Veirano Advogados, afirma que a decisão não poderia alcançar contribuintes que possuem decisões definitivas e já entraram com pedido de compensação junto à Receita Federal.

Encontro de contas

Segundo ele, em 2009, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a lei que regula a compensação tributária é aquela vigente na data do chamado encontro de contas (Tema 345).

Em 2011, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) definiu esse encontro de contas como o momento da entrega da primeira Declaração de Compensação (DComp) ao Fisco, que traz o valor total pago a mais ao governo.“Não há direito adquirido na compensação, ela vai seguir a norma do momento”, afirma Paranhos. “O ponto é que, quando a gente fala de encontro de contas, a própria Procuradoria da Fazenda, seguindo o entendimento do STJ, diz que esse momento é a apresentação da primeira declaração de compensação.”

Segundo o tributarista, a Receita não deve aceitar novas compensações com base nesse argumento, o que obriga as empresas a recorrerem ao Judiciário.

Contribuinte deve recorrer à Justiça

O escritório Mattos Filho avalia que a limitação para a compensação de créditos tributários pode ser questionada na Justiça pelos contribuintes, inclusive em razão de a restrição trazida possuir características de empréstimo compulsório.

Eduardo Melman Katz, sócio da área de tributário do escritório, avalia que a restrição à medida provisória (MP) é mais ampla e cita a impossibilidade de aplicação para créditos de ações ajuizadas antes da nova norma, em linha com manifestações do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em situações análogas.

“Os créditos decorrentes de ações ajuizadas antes da MP não poderiam ser atingidos. A medida provisória e a portaria não trazem essa ressalva de forma expressa, de forma que muitos contribuintes certamente vão ingressar em juízo buscando preventivamente assegurar o direito de seguir compensando normalmente os seus créditos”, afirma o Katz.

David Andrade Silva, tributarista e sócio da Andrade Silva Advogados, também avalia que a medida não deveria alcançar ações que já foram ajuizadas, mesmo nos casos que ainda não têm decisões definitivas.

A decisão do STF sobre a tese de século se deu em uma ação específica, que teve repercussão geral e deve ser aplicada a todos os outros casos que tramitam no Judiciário. Silva afirma que muitas ações ainda não transitaram em julgado.“A empresa percorre anos no Judiciário e, quando vai compensar, vem essa medida do governo de limitar a compensação no tempo e em percentuais. É um verdadeiro calote. Vai gerar uma judicialização enorme.”

Thiago Barbosa Wanderley, sócio do Salles Nogueira Advogados, afirma que a medida do governo representa duas afrontas à Constituição ao ir contra o direito adquirido e o princípio da legalidade.

Para o tributarista, a portaria não pode limitar a compensação de quem já tem ações que transitaram em julgado, mesmo que a declaração de compensação não tenha sido apresentada ainda.

“O governo está limitando a utilização de um crédito que já foi transitado em julgado. Está obrigando a empresa a colocar a mão no bolso para pagar uma dívida, quando ela ainda tem um crédito substancial contra a União. Essa medida certamente vai ser alvo de uma corrida para o Judiciário.”

O escritório Machado Meyer diz que existem argumentos sólidos para questionar essa restrição em reaver valores recolhidos indevidamente para o fisco e que a alteração viola a coisa julgada e pode configurar possível confisco.

Bruna Miguel, sócia da área tributária do Machado Meyer, afirma que a MP não deixa claro qual será o alcance da restrição. “A portaria teve o condão apenas de dispor sobre o limite mensal mínimo que deverá ser observado pelo detentor do crédito para fins de compensação, não tendo tratado sobre a questão relacionada ao alcance dos efeitos dessa restrição, o que ainda poderá ser objeto de regulamentação por ato da Secretaria Especial da Receita Federal”, afirma.

Segundo o Ministério da Fazenda, o objetivo da medida é resguardar a arrecadação federal ante a possibilidade de utilização de créditos bilionários para a compensação de tributos. A expectativa da pasta é que em 2023 a marca de R$ 1 trilhão em débitos compensados nos últimos cinco anos tenha sido ultrapassada. Quase 40% das compensações feitas desde 2019 envolveram decisões judiciais, sendo que 90% se referem à tese do século.

 

Fonte: Diário do Comércio

Inscreva-se para receber atualizações por e-mail

Mantenha-se atualizado com as últimas atualizações de impostos e conformidade que podem afetar seus negócios.

Author

Sovos

A Sovos foi construída para resolver as complexidades da transformação digital dos impostos, com ofertas completas e interligadas para determinação de impostos, controles contínuos das transações, relatórios de impostos e muito mais. Os clientes da Sovos incluem metade das 500 maiores empresas da Fortune, bem como empresas de todos os tamanhos que operam em mais de 70 países. Os produtos SaaS e a plataforma proprietária Sovos S1 da empresa se integram com uma grande variedade de aplicações comerciais e processos de conformidade governamental. A Sovos tem funcionários em todas as Américas e Europa, e é propriedade da Hg e TA Associates.
Share This Post

Brazil Conformidade fiscal Latin America
August 2, 2024
Sovos anuncia novos diretores para o Brasil e LATAM

A Sovos anunciou a chegada de dois novos executivos. Marcia Silva, atuará como Diretora de Commercial Sales LATAM, atuando nos Estados Unidos, e Mauro Levin, como Senior Sales Director no Brasil, especificamente na área de contas estratégicas. Segundo a empresa, ambos os executivos integrarão a equipe já comandada por Marcelo Souza, brasileiro que hoje atua […]

Brazil Conformidade fiscal Latin America
June 18, 2024
Tecnologia no protagonismo da Reforma Tributária

Segundo cronograma previsto pelo Governo, 2026 será o “ano teste” da CBS, que entrará em vigor, de fato, em 2027, com a extinção do PIS e da Cofins. Aprovada pelo Congresso Nacional em dezembro de 2023, a Reforma Tributária estabelece a substituição de cinco tributos (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins) por dois novos, o […]

Brazil Conformidade fiscal
June 4, 2024
Projeto que regulamenta reforma tributária será discutido na Câmara nesta terça

Apelidado pelo governo de Lei Geral do IBS, da CBS e do Imposto Seletivo, o projeto foi entregue à Casa no final de abril O projeto que regulamenta a reforma tributária e institui três novos impostos deve ser analisado e debatido nesta terça-feira, 4, na Câmara dos Deputados. Apelidado pelo governo de Lei Geral do IBS, da […]

Brazil Conformidade fiscal Latin America
June 1, 2024
Principais alterações na legislação – De 27/05/2024 a 01/06/2024

Acompanhe as principais alterações na legislação que impactam no seu dia a dia! Ceará Publicado em 22/05/2024 – DECRETO N° 36.025, DE 22 DE MAIO DE 2024 ICMS – Altera o Decreto n° 32.485, de 03 de janeiro de 2018, que dispõe sobre a substituição tributária nas operações com aparelhos celulares e cartões inteligentes (SMART […]

Brazil Conformidade fiscal Latin America
May 24, 2024
Principais alterações na legislação – De 20/05/2024 a 24/05/2024

Acompanhe as principais alterações na legislação que impactam no seu dia a dia!   Alagoas Publicado em 15/05/2024 – INSTRUÇÃO NORMATIVA SURE N° 019, DE 13 DE MAIO DE 2024  ICMS – Altera a Instrução Normativa SURE N° 13/2023, de 24 de julho de 2023, que estabelece valores a serem utilizados como base de cálculo […]

Cookie Settings